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segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Rainha Sofia, una cajita de propaganda

Mujeres públicas—"Cajita de fósforos" (2005)

Liberdade de expressão selecionada por um burocrata

por ANTÓNIO CERVEIRA PINTO 

Em nome da liberdade de expressão (1) o Museu Reina Sofía prestou um mau serviço à arte e está enredado numa aporia curatorial de índole tipicamente burocrática da qual não saberá sair sem recorrer à cumplicidade neocorporativa do pós-humanismo militante e pensamento politicamente correto que acolhe invariavelmente o mesmo lado cansado da História.

No principal museu espanhol de arte contemporânea, em Madrid, Espanha, um país maioritariamente católico, como é sabido, que ainda não sarou as feridas da sua última guerra civil, como é sabido, que caminha a largos passos para uma nova e explosiva crise de identidade nacional, como todos sabemos, Manuel Borja-Villel acha que os museus do estado devem ser transformados em laboratórios de agitação e propaganda (2).

Pois bem, então porque não preparou ele, em vez desta provocação gratuita, uma exposição de “saber realmente útil”, com artistas catalães, sobre “conexiones inesperadas, capaces de crear comunidades invisibles y nuevas experiencias de lo común y compartido”, a fim de “restablecer una relación no mediada por el saber”, e “apoyar un pensamiento crítico”, fazendo finalmente do campo atualmente minado do museu de arte moderna e contemporânea de Madrid (3) uma “institución viva”, “que se posiciona como un importante catalizador del pensamiento y del debate público”?

Porquê? Até onde vai e de que género é a sua autoridade em matéria de liberdade de expressão concedível aos que expõem no museu que dirige?

Em nome dos princípios invocados no comunicado de imprensa que respondeu ao clamor de alguma direita religiosa mais destemperada contra a exposição Un saber realmente útil, porque não levar amanhã mesmo o debate público sobre a independência da Catalunha ao laboratório de ideias do antigo Hospital de San Carlos? Seria bem mais crítico, estimulante, inovador e atual, em matéria de arte, de estudos culturais e de museologia de arte contemporânea, do que a cruzada gráfica medíocre do coletivo feminista argentino contra a religião católica. Não acha, Manuel Borja-Villel ?

A ideia de que num museu não há censura, mas apenas gosto, opções, escolhas críticas, perspetivas culturais e agendas mais ou menos incestuosas, carreiristas e quase sempre comerciais, é a mais hipócrita de quantas conheço. Em nome de que liberdade pontifica o Museu Reina Sofia através do seu diretor?

Se a igreja ardente das Mujeres públicas fosse uma sinagoga, o comportamento do museu Rainha Sofia teria sido o mesmo? E se fosse uma mesquita? E se fosse uma obra de arte homofóbica? Quem levaria a cabo a censura? Ou será que tudo isto seria exposto em nome da liberdade de expressão e em nome da liberdade criativa? E fosse mais uma obra de arte sexista? E fosse tão só uma obra de péssima qualidade, como a "Cajita de fósforos" obviamente é, a quem caberia a missão higiénica da depuração?

Pelo escândalo montado, ficamos a saber que pelo menos alguma propaganda boçal tem acesso livre ao principal museu do estado espanhol dedicado à contemporaneidade.

Com tanta coisa extraordinária para mostrar há que ter o bom senso de não provocar gratuitamente o público, ainda por cima em nome da arte. A maioria das pessoas e dos contribuintes de um país merecem mais profissionalismo e gestão prudente sem perda da verdadeira ousadia.

Entregar o museu à sociedade do espetáculo é um péssimo serviço à arte.

Uma pessoa politicamente insensível não é certamente o gestor indicado para dirigir um museu nacional.


Notas
  1. Comunicado de imprensa do Museu Rainha Sofia sobre o incidente com a exposição Un saber realmente útil:
    Ante las quejas manifestadas por parte de algunos sectores a través de diversos medios, en relación a la exhibición de la obra 'Cajita de fósforos' (2005), del colectivo “Mujeres Públicas”,  en el contexto de la exposición “Un saber realmente útil”, el Museo Reina Sofía quiere dejar constancia de las siguientes cuestiones:
    Las obras de arte que están presentes en esta muestra reflejan únicamente las opiniones de sus autores, pero no representan en modo alguno una opinión o actitud del Museo en relación a los asuntos y expresiones que en ellas se manifiestan.
    El Museo Reina Sofía respeta la libertad de expresión y la libertad de creación artística, de igual modo que respeta todas las creencias y la libertad de opinión de las personas que han sentido herida su sensibilidad.
    Por otra parte, esta institución no ha censurado ni puede censurar la obra de un artista, pues atentaría de lleno contra la libertad de expresión, que viene amparada por nuestra Constitución. El censurar una obra violaría el derecho a la difusión artística.
    En lo que se refiere en concreto a  la obra en cuestión, que ha sido mostrada anteriormente en otras exposiciones, utiliza una expresión propia de un contexto histórico específico y determinado, y sólo puede ser interpretada y discutida metafóricamente en el presente. Es así como lo entienden las artistas. Asimismo, una obra de arte no tiene una única interpretación y ofrece siempre la posibilidad de expresión de múltiples puntos de vista sobre ella.
    Por último, hay que destacar también que, en el ámbito de las funciones que competen al Museo Reina Sofía, éste intenta ser un espacio de diálogo y reflexión sobre distintos temas, algunos de ellos controvertidos, sin que ello implique, en ningún caso, ánimo de ofender o un ataque a las creencias de los visitantes, por los que siente el más absoluto de los respetos, como no puede ser de otra forma.
  2. Talvez por isso nunca tenha dirigido um museu, público ou privado, seja no Reino Unido, na Alemanha, e muito menos nos Estados Unidos. 
  3. As minas chamam-se 'estudos culturais', uma praga que tem vindo a esfacelar e a destruir a autonomia estética e o fazer artístico em todo o mundo com arremedos manhosos de sociologia, antropolgia, psicologia, ciênxia e filosofias de bolso.