Ana Mata, “Sem Título”, 2023. Acrílico e óleo s/tela, 33x30 cm |
A propósito de uma discussão sobre a obra de Ana Mata num post no FB de Victor Pinto da Fonseca
Por veredas opostas, ambos os protagonistas deste debate relâmpago (Alexandre Pomar e Catarina Patrício) destacam uma autora (Ana Mata) e uma obra que suscita um debate saudável. Oxalá contribua para evitar a agit-prop dominante a que as instituições culturais sucumbirão inexoravelmente se não existir contraditório e alteridade, como, afinal, parece existir!
Não tive infelizmente oportunidade de ver 'in situ' as pinturas expostas por Ana Mata na Galeria 111. Apesar desta limitação (fotográfica/ cibernética) creio poder dizer que, mais do que um novo caso de realismo fotográfico na pintura, ou de hiperrealismo pictórico de origem fotográfica, estamos na presença de uma obra que, através da pintura resgatada da fotografia preparatória (instrumental), marca uma distância clara relativamente a dois tropos dominantes na arte dita contemporânea. Um dos tropos é o da desfiguração/abstração da representação pictorial (Cézanne, cubismo, Mondrian) em direção a uma arte nominalista, de recorte iconoclasta e intelectual, conceptual e teatral (Duchamp, minimalismo, Richard Serra, Dan Graham, Allan Kaprow, Gordon Matta-Clark). O outro é o da arte revolucionária, propagandística, imerso na retórica da utopia.
A fotografia propriamente dita, na sua avassaladora complexidade cultural, não é assunto tratado pela obra de Ana Mata, se não na medida em que, a mediação fotográfica das suas encenações inscreve (para usar um termo antropológico conhecido) na realização da sua pintura um certificado, por assim dizer, 'barthesiano', de autenticidade. Há um 'isto foi' (que A. Pomar reclama como espaço de intimidade), nos auto-retratos, nas 'still life' florais e nas paisagens de Ana Mata. É este o único automatismo aparente da sua pintura. Digo aparente porque a fotografia, ao contrário do que algumas leituras apressadas (ou meramente académicas estafadas) de Walter Benjamin persistem em anunciar, nunca foi automática e sempre foi manual, desde a posição da câmara, à seleção das lentes, ou dos filtros, à câmara escura onde se dava banho e se lavavam as fotografias, e que hoje, na era da fotografia digital, deu lugar a uma colaboração, consciente e inconsciente, com a Inteligência Artificial. E antes de tudo isto que foi sempre da ordem da decisão mental e do treino manual, há a vontade de figurar, de fixar numa imagem a realidade que passa. Que seja uma vontade íntima de visualização, de representação, de idealização, e de manifestação livre da subjetividade concreta, eis o que importa. Um artista não deve ser um simples cortesão, nem um mero agente de propaganda.
Por fim, não deixa se ser irónico constatar que a falência previsível da imprensa escrita, e mesmo da televisão, esteja finalmente a dar (entre nós) espaço à Internet e às redes sociais, para o diálogo e a crítica.
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